A Lei 9279/ 96 tutela os Direitos de Propriedade Industrial que são as marcas, patentes e desenho industrial. Essa mesma Lei regula também as questões de concorrência desleal, cujos atos são definidos como crime pelo artigo 195:
Art. 195. Comete crime de concorrência desleal quem:
I – publica, por qualquer meio, falsa afirmação, em detrimento de concorrente, com o fim de obter vantagem;
II – presta ou divulga, acerca de concorrente, falsa informação, com o fim de obter vantagem;
III – emprega meio fraudulento, para desviar, em proveito próprio ou alheio, clientela de outrem;
IV – usa expressão ou sinal de propaganda alheios, ou os imita, de modo a criar confusão entre os produtos ou estabelecimentos;
V – usa, indevidamente, nome comercial, título de estabelecimento ou insígnia alheios ou vende, expõe ou oferece à venda ou tem em estoque produto com essas referências;
VI – substitui, pelo seu próprio nome ou razão social, em produto de outrem, o nome ou razão social deste, sem o seu consentimento;
VII – atribui-se, como meio de propaganda, recompensa ou distinção que não obteve;
VIII – vende ou expõe ou oferece à venda, em recipiente ou invólucro de outrem, produto adulterado ou falsificado, ou dele se utiliza para negociar com produto da mesma espécie, embora não adulterado ou falsificado, se o fato não constitui crime mais grave;
IX – dá ou promete dinheiro ou outra utilidade a empregado de concorrente, para que o empregado, faltando ao dever do emprego, lhe proporcione vantagem;
X – recebe dinheiro ou outra utilidade, ou aceita promessa de paga ou recompensa, para, faltando ao dever de empregado, proporcionar vantagem a concorrente do empregador;
XI – divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos, informações ou dados confidenciais, utilizáveis na indústria, comércio ou prestação de serviços, excluídos aqueles que sejam de conhecimento público ou que sejam evidentes para um técnico no assunto, a que teve acesso mediante relação contratual ou empregatícia, mesmo após o término do contrato;
XII – divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos ou informações a que se refere o inciso anterior, obtidos por meios ilícitos ou a que teve acesso mediante fraude; ou
XIII – vende, expõe ou oferece à venda produto, declarando ser objeto de patente depositada, ou concedida, ou de desenho industrial registrado, que não o seja, ou menciona-o, em anúncio ou papel comercial, como depositado ou patenteado, ou registrado, sem o ser;
XIV – divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de resultados de testes ou outros dados não divulgados, cuja elaboração envolva esforço considerável e que tenham sido apresentados a entidades governamentais como condição para aprovar a comercialização de produtos.
Porém, é na esfera civil que os atos de violação de direitos de PI e concorrência desleal são enfrentados de forma mais eficiente e corriqueira através de Ação Judicial que tenha por objeto o pedido de proibição da prática dos atos que caracterizam a concorrência desleal, acumulado com pedido de indenização pelos danos causados. É o que prevê o artigo 209 da Lei 9279/ 96.
Art. 209. Fica ressalvado ao prejudicado o direito de haver perdas e danos em ressarcimento de prejuízos causados por atos de violação de direitos de propriedade industrial e atos de concorrência desleal não previstos nesta Lei, tendentes a prejudicar a reputação ou os negócios alheios, a criar confusão entre estabelecimentos comerciais, industriais ou prestadores de serviço, ou entre os produtos e serviços postos no comércio.
§ 1º Poderá o juiz, nos autos da própria ação, para evitar dano irreparável ou de difícil reparação, determinar liminarmente a sustação da violação ou de ato que a enseje, antes da citação do réu, mediante, caso julgue necessário, caução em dinheiro ou garantia fidejussória.
§ 2º Nos casos de reprodução ou de imitação flagrante de marca registrada, o juiz poderá determinar a apreensão de todas as mercadorias, produtos, objetos, embalagens, etiquetas e outros que contenham a marca falsificada ou imitada.
Destacamos no texto acima o parágrafo 1o. que prevê a possibilidade de concessão de liminar pelo Juiz para determinar a sustação da violação dos Direitos de Propriedade Industrial e que consistem em atos de concorrência desleal.
A primeira observação que deve ser feita é que a liminar prevista na Lei visa a proteger aquele que ingressa em Juízo pedindo tal providência, alegando prejuízo ou danos irreparáveis.
No entanto, nem sempre a parte Ré contra a qual se pede a liminar é um usurpador de direitos, sendo que em inúmeros casos, trata-se de um empreendedor no exercício regular de uma atividade econômica, que eventualmente se torna concorrente ( de forma direta ou potencial) do demandante.
Diante desta circunstância, uma decisão liminar concedida de forma precipitada e sem a observância dos requisitos necessários, pode possuir efeitos danosos ao Réu que, a depender do caso, sucumbirá antes do processo chegar ao fim.
Neste caso, é necessário observar que não basta a alegação do Autor de que é vítima de atos de concorrência desleal e que está sofrendo danos irreparáveis, para que o Juiz conceda a liminar da Lei 9279/ 96.
Tecnicamente, essa liminar representa uma tutela de urgência, cuja regulação é feita detalhadamente pelo Código de Processo Civil, cabendo ao artigo 300 estabelecer os requisitos para a sua concessão, conforme se lê abaixo:
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
§ 1 o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.
§ 2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.
§ 3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão
Neste artigo, vemos que há dois requisitos básicos para a concessão da tutela de urgência:
- probabilidade do Direito
- perigo de dano ou ao resultado útil do processo.
Cabe ainda acrescentar a esses dois requisitos uma ordem legal de que a tutela de urgência não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão (liminar).
A Lei de Propriedade Industrial estabelece que deverão ser observadas as regras do Código de Processo Civil e algumas regras processuais específicas acerca das ações decorrentes da violação dos Direitos nela tutelados, dentre as quais a previsão de concessão de liminar.
O que pretendemos afirmar é que a leitura do parágrafo 1o. do Artigo 209 da Lei 9279/ 96 deve ser feita em conjunto com o Artigo 300 do CPC, atualizando o conceito da liminar concedida nas Ações que visam a tutelar os Direitos de Propriedade Industrial.
Nesse sentido, não basta a constatação de dano irreparável ou de difícil reparação, sendo indispensável que o Juiz também observe a probabilidade do Direito e se assegure de que a sua decisão não trará para a parte demandada uma situação tão grave que não poderá ser desfeita ou irreversível.
Quando se fala em probabilidade do Direito, nem sempre é suficiente que o Autor mostre que possui um registro de PI ( marca, patente, desenho industrial), ou que o resultado financeiro econômico do seu negócio está sendo prejudicado pela concorrência feita pelo Réu. Não há ilegalidade na concorrência.
É indispensável, pois, a demonstração ativa, de plano, de que o Réu está na prática de um ato ilícito, vedado pela Lei, através de provas consistentes.
Isto porque há casos em que nem tudo é o que parece, sobretudo no âmbito da concorrência entre agentes econômicos. Muitos dos Direitos de Propriedade Industrial comportam uma série de nuances estabelecidas pelo trabalho incessante dos Tribunais do País, onde se reconhece o Direito de convivência de marcas, a mitigação de exclusividades etc.
Neste caso, para que o Juiz tenha condições de decidir acerca de uma tutela antecipada ou liminar em ações de concorrência desleal, a manifestação prévia do demandado é indispensável para evitar atos judiciais que impeçam o exercício das atividades empresariais ou retiram elementos estratégicos de marketing do empreendimento, a ponto de inviabilizar a atividade econômica, o que pode ocasionar a irreversibilidade da decisão.
Por fim, mesmo que em tese estejam presentes os requisitos da probabilidade do direito e do perigo de dano, cabe ao Juiz exercer um Juízo de ponderação sobre a gravosidade da ordem a ser dada, para que não torne irreversível a sua própria decisão ao final do processo.
Muitas vezes, a demanda chega ao final com um resultado inverso. O Réu é quem está na sua razão, mostrando que exerce o seu direito através da atividade econômica lícita (exercício regular de um direito). Porém, ao final do processo, já não possui mais condições de manter-se na atividade exercida por ocasião da tutela de urgência (liminar) e em razão dela. Neste caso, o demandante alcançou o seu intento de retirar um concorrente do mercado, sob a chancela do Poder Judiciário.
Muito bom o texto. Conciso e explicativo